sexta-feira, 28 de agosto de 2020

O Teatro Negro no Brasil


          A necessidade de se verem representados nos palcos fez com que grupos formados por artistas negros como o Bando de Teatro Olodum (1990), em Salvador, criassem espetáculos que trouxessem às questões da igualdade e da discriminação para o primeiro plano. Porém, esta problemática não é nova na dramaturgia brasileira. Ela surgiu pela primeira vez no Teatro Experimental do Negro - TEN, fundado em 1944 no Rio de Janeiro por Abdias Nascimento (1914-2011), um dos maiores nomes do ativismo negro no Brasil.

          O TEN procurou fomentar uma valorização do negro brasileiro a partir da criação de uma dramaturgia que discutisse a situação dessa população na sociedade, e que criasse personagens que fugissem dos estereótipos presentes nas peças e filmes do período, onde os negros e as negras eram representados de forma caricata e grosseira. O TEN funcionou até 1968 quando Abdias Nascimento fugindo da perseguição política promovida pelo Regime Militar exilou-se nos Estados Unidos. O Teatro Experimental do Negro foi mais que um coletivo artístico porque sua atuação incluía a educação e a cidadania através de cursos de alfabetização de adultos e da militância em defesa da inclusão da população negra na sociedade brasileira.

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Abdias do Nascimento (1914-2011). Economista e sociólogo que se tornou o maior nome do movimento negro brasileiro. Além de ter criado o Teatro Experimental do Negro foi o organizador do I Congresso do Negro Brasileiro, realizado na cidade do Rio de Janeiro em 1950. Exilado tonou-se professor universitário nos EUA. Em 1982 retornou definitivamente ao Brasil e no ano seguinte tornou-se deputado federal. A luta em prol de uma sociedade mais justa e inclusiva marcará toda a sua trajetória política e intelectual.



          Surgido em 1990 na cidade de Salvador a partir da iniciativa dos diretores teatrais Márcio Meirelles e Chica Carelli o Bando de Teatro Olodum reúne artistas negros de diversas gerações. Seus espetáculos são inspirados na cultura negra baiana e engajados na luta contra a discriminação étnico-racial. Entre seus muitos trabalhos, destaca-se Ó paí, ó! (1992), peça que faz parte da trilogia do Pelô, que inclui também Essa é Nossa Praia (1991) e Bai Bai Pelô (1994).

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Ó paí, ó! (2007), Texto Marcio Meirelles e Bando de Teatro Olodum. Direção Márcio Meirelles. Teatro Vila Velha, Salvador.  
 

O espetáculo Ó paí, ó  é uma criação coletiva de todo o elenco do Bando de Teatro Olodum. A partir de improvisações os atores foram construindo as cenas e dando vida aos personagens da peça, o diretor Márcio Meirelles alinhou as ideias e deu o acabamento final ao texto dramático. O enredo de   Ó paí, ó  como das outras peças da trilogia do Pelô  faz  referência às transformações do Pelourinho, em Salvador. 

No início do século XX o bairro concentrava as melhores moradias da cidade, mas na década de 1950 com a mudança do centro comercial para outra região, o bairro entra num processo de degradação e abandono o que faz com que até a década de 1980 ele fosse estigmatizado como zona de marginalidade. 
Devido ao preço baixo dos aluguéis e por estar localizada numa região central, e próxima ao porto, muitas pessoas começaram a se mudar para os casarões antigos e abandonados da região do Pelourinho. Em 1985, devido ao conjunto arquitetônico colonial e a importância da região para a consolidação da cultura africana em terras americanas, já que foi um porto importante no comércio transatlântico, o Pelourinho foi tombado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) como Patrimônio da Humanidade. 
  
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Pelourinho, Salvador/BA. 

O título recebido fez com que na década de 1990 o Pelourinho começasse a passar por um processo de revitalização. Ao mesmo tempo em que trouxe benefícios esse processo causou muitos conflitos porque os atuais moradores por não conseguirem arcar com o novo custo de vida trazido pelas melhorias urbanas foram paulatinamente expulsos da região.  
A peça Ó paí, ó!  trata justamente  do problema da moradia e da exclusão social que a população do Pelourinho, formada majoritariamente por negros enfrentou. O texto teatral foi adaptado em 2007 para o cinema e no ano seguinte transformado numa série de televisão.   Tanto o filme quanto a série se passam num edifício antigo e deteriorado. A água e a luz são precárias. Os moradores enfrentam o perigo de morar num prédio que não possui condições mínimas de segurança. Entretanto, morar ali é a única opção dos personagens que não possuem condições financeiras de mudar-se para outro espaço. A maioria das pessoas que moram no prédio vivem do comércio informal, são vendedoras, engraxates, carregadoras de caixas, guias turísticos, artistas que enfrentam com muitas dificuldades o cotidiano.  
Discutir as condições do negro brasileiro contemporâneo é uma das questões principais do Teatro Negro, termo que diz respeito aos diversos grupos teatrais brasileiros, formados principalmente por artistas afrodescendentes, que se dedicam a pensar e a criar uma dramaturgia e uma encenação fortemente marcada pela diáspora africana.    

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Ó paí, ó!  (2007). Filme dirigido por Monique Gardenberg a partir da peça homônima de Márcio Meirelles e Bando de Teatro Olodum.    

                                  

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